«(...) Não se pode dizer que aquele que sonha está privado da realidade, absolutamente livre
ou fora dela, mas sim que a padece, que está sob ela; que não pode nem contê-la, nem ordená-la, que está privado (...), despossuído de si, alienado na realidade que o invade. Alienado, em sonhos, por não ter tempo.
Mas também alienado na vigília por ter de andar no tempo, mais livre e consciente. Enquanto que em sonhos, perdido na realidade, mesmo na sua, pode deixá-la aparecer por momentos sem interferência ou sombra, só por momentos. Pois se o homem entra na vigília pelo despertar, é porque no sonho inicial que a sua vida primeira parece ser não pode alcançar-se a si mesmo, ser si mesmo.
Porque, se a vida é sonho, é sonho que pede despertar.
Alienação inicial de alguém que procura identificar-se. E daí a angústia subjacente aos sonhos, mesmo os felizes.
Pois o sonho pede realidade.(...)».
María Zambrano, In Os Sonhos e o Tempo.
Lisboa, Relógio D’Água Editores, 1994: 14 (formatação n.).
No comments:
Post a Comment